Blogue Blue

Blogue Blue

terça-feira, 30 de agosto de 2011

O percurso artístico do fotógrafo Achutti



Por Francisco Ribeiro, de Porto Alegre


No olhar do artista, o homem e seus sonhos, angústias e indagações, expressões captadas pela câmera fotográfica.
.
Encontrou seu meio de expressão na fotografia. Ela lhe possibilitou estudos, trabalho, viagens, publicação de livros, relações que ampliaram seus horizontes, e o reconduziu, sempre, de volta à capital dos pampas para expor aquilo que havia aprendido e apreendido lá fora, com os ângulos e composições que escolhera, mostrando-se, enfim, artista.
Porto Alegre tem seus aventureiros e Luiz Eduardo Robinson Achutti é um deles. 

Entre o Achutti da Coojornal, cuja aparência física era uma mistura de roqueiro inglês e surfista, e o senhor, careca in progress, recebendo a homenagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), passaram-se 35 anos.

Através de suas câmeras, seja Pentax ou Leica (noblesse oblige), Achutti fez registros jornalísticos importantes, tais como: a Nicarágua, em 1988, quando ainda se confrontavam sandinistas e contra-revolucionários; a queda do muro em Berlim, 1989. Também esteve em Cuba, e, no final dos anos 1990, fotografou, artisticamente, a Paris pós-Sartre (um autor caro a Achutti).

É essa longa caminhada de três décadas e meia – estabelecendo um diálogo entre o processo criativo e a trajetória artística – que retrata o catálogo da exposição Percurso do Artista– Achutti, uma publicação realizada graças à parceria entre a Imprensa Oficial do Rio Grande do Sul e a UFRGS (Pró-Reitoria de Extensão).

São 232 páginas, edição bilíngue (português-inglês), que revelam através de textos e fotos uma cronologia de vida em que, se não faltaram loucuras, também não foi desprovida de organização e método, como na transformação do aluno do colégio João XXIII em professor universitário, tudo comprovado por este breve currículo acadêmico: bacharel em Ciência Sociais e mestre em Antropologia pela UFRGS, e doutor em Antropologia pela Universidade Paris 7.

Profissão: fotógrafo. Influência e culpa do avô, o também fotógrafo Bortolo Achutti, definido carinhosamente pelo neto como “um alquimista da luz”, e não do verbo, pois isso é para escritores. Ambos, contudo, são ladrões de fogo, frase célebre de Arthur Rimbaud, o poeta flâneur e voyeur, emoldurando a lua através da janela do quarto, de preferência uma chambre de bonne, água-furtada, em Saint-Germain-des-Prés. Livros, vinho, baguette, queijo camembert. Dá para viver assim, em Paris.

Assim se pensa quando se tem 20 anos, e o Achutti que chega a França para fazer o doutorado já é um homem maduro e com múltiplas influências na sua arte, pois a fotografia também tem uma longa galeria de heróis e mártires, a começar por Robert Capa, famoso pelas coberturas de guerras, morto, de câmera na mão, na Indochina, em 1954, ao pisar numa bomba.

Mas, a grande referência para Achutti é Henri Cartier-Bresson, cujo nome dispensa apresentação, e que, juntamente com Capa, fundou a agência de fotojornalismo Magnum, em 1947.

A inclinação de Achutti para a antropologia, como nos mostra a sua pós-graduação, o conduziria, naturalmente, a Bresson, famoso que foi por explorar com sua câmera aspectos etnográficos na Europa, África, China. Achutti tem vários trabalhos neste campo, tendo, inclusive, publicado o livro L’homme sur la photo – Manuel de photoethnographie, pela editora Téraèdre, em Paris.

No olhar de Achutti, o homem e seus sonhos, angústias e indagações, expressões captadas pela sua máquina fotográfica, legadas à história, como a da velhinha francesa, enérgica, segurando o jornal Le Monde, ou de soldados adolescentes na Nicarágua. Como estarão eles? Sobreviveram? Há também as imagens dos artistas em seus momentos sublimes de criação, casos de Iberê Camargo e Xico Stockinger, ambos transformados em livros.

Nesses 35 anos, passou-se do sistema analógico ao digital, mas a fotografia, enquanto arte, continua a exigir sensibilidade e domínio técnico. Sua força, como pensa Achutti, “está na composição, na forma como se escolhe recortar a realidade com as ferramentas da intuição e da nossa visão de mundo”.

Percurso do Artista – Achutti, é um convite à arte da fotografia. Prova que o Rio Grande do Sul e o Brasil, de uma forma mais abrangente, também conseguem reconhecer seus artistas. Nem todos, infelizmente, e muitas vezes, quando o fazem, não dão a atenção devida ou o valor que achamos que deveriam dar.
Para um aventureiro é importante que o sol, de vez em quando, também brilhe, um pouco de sorte, e como a estatização da felicidade provou ser uma quimera, a arte permanece como um excelente campo para aventuras e utopias.
28/8/2011
Fonte: ViaPolítica/O autor
Francisco Ribeiro é jornalista, mestre em Lingüística pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, França, e doutor em Letras pela PUCRS. Também é roteirista e diretor de audiovisuais.
E-mail: f.corib@uol.com.br

Sem comentários: