Blogue Blue

Blogue Blue

sábado, 29 de agosto de 2015

Catadores lançam campanha por reconhecimento e participação na Coleta Seletiva


 | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Catadores que utilizam veículos de tração humana não poderão mais atuar na capital | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Por Débora Fogliatto - SUL21

Uma campanha para valorizar o trabalho de catadores e catadoras em Porto Alegre foi lançada este mês, mas é fruto de discussões e reivindicações existentes há anos. A categoria alega ser desvalorizada pela Prefeitura Municipal, que não contrata os trabalhadores para realizar a Coleta Seletiva, optando por fazer licitações de empresas privadas, e implementa uma lei que busca acabar com as carroças e carrinhos.

A conversa entre o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) e o poder público foi iniciada em 2003, mas com o passar dos anos não resultou em maior reconhecimento da categoria. Atualmente, eles acabam realizando um trabalho paralelo ao do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), que realiza a Coleta Seletiva. Ao mesmo tempo, milhares de resíduos são recolhidos diariamente por catadores, que trabalham em galpões de reciclagem em condições geralmente precárias.

Os catadores argumentam que o Código Municipal de Limpeza Urbana prevê a contratação de seus serviços para a Coleta Seletiva, através de suas organizações, mas isso não é cumprido pelo poder municipal. Recentemente, a Prefeitura anunciou o edital de licitação para contratação de uma nova empresa para realizar a coleta.
Diante da ausência de respostas, os catadores lançaram a campanha Coleta Seletiva Solidária, que permite que a população apoie sua luta através da separação de lixo para ser recolhido por eles. “Estamos nos mobilizando para que as pessoas intercedam no apoio aos catadores, para que a Prefeitura invista no protagonismo dos trabalhadores ao invés de na iniciativa privada”, explicou Alex Cardoso, líder do MNCR no Rio Grande do Sul.
Ele conta que havia negociações sendo feitas com uma equipe técnica da Prefeitura, mas que nunca aconteceram no âmbito político. “Iniciamos uma negociação com os técnicos, para a criação de um plano piloto de coleta seletiva, com bairros Tristeza e Assunção. Em dezembro, encaminhamos um documento para o DMLU para oficializar a cooperativa, mas eles nunca responderam”, contou Alex. A partir daí, o diálogo com o Executivo foi cortado, segundo ele.

Foto: Ocimar Pereira / PMPA
DMLU recolhendo resíduos: catadores pedem participação - Foto: Ocimar Pereira / PMPA













Na quarta-feira (26), representantes do movimento foram até o Ministério Público apresentar os documentos que já foram encaminhados para a Prefeitura e as determinações do Código de Limpeza. A reivindicação é que o órgão possa cobrar uma resposta por parte do poder municipal.
O DMLU argumenta que a coleta Seletiva é feita por meio de contratos regulares desde 1991, e que o processo está “bem constituído na cidade”, portanto, a nova licitação apenas mantém o processo, além de “ampliar e qualificar”. Através do programa Todos Somos Porto Alegre, a Prefeitura diz manter contato e diálogo com os catadores. “O programa visa à emancipação de carroceiros e carrinheiros por meio de novas oportunidades de trabalho”, afirma o DMLU.

Carroças e carrinhos de tração humana*
Essas novas oportunidades são necessárias devido à aprovação do decreto nº 16.638, que regulamenta a lei nº 10.53, prevendo a redução gradativa da circulação de carroças e carrinhos até 2016. A lei, aprovada em 2007 e proposta pelo atual vice-prefeito Sebastião Melo (PMDB), que na época era vereador, é criticada por movimentos organizados e cooperativas de carroceiros e carrinheiros.

A lei previa que a atividade fosse extinta dentro de oito anos, mas reuniões realizadas na Câmara de Vereadores ao longo deste tempo indicam que talvez o prazo não possa ser cumprido. O vereador Marcelo Sgarbossa (PT), que preside a Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam), acompanha a questão e constatou que o processo não tem dado certo, visto que o cadastramento que está sendo feito não foi bem-sucedido em encontrar os catadores. Ele protocolou um projeto de lei que procura estender o prazo de aplicação da lei, para que ela possa ser implantada até 2017.

A partir deste cadastro, os carroceiros seriam encaminhados para cursos profissionalizantes e, em seguida, ao mercado de trabalho. No entanto, o MNCR observou que “na prática, os cursinhos não encaminham nada”. Sgarbossa aponta que, ao invés de criminalizar, a Prefeitura poderia criar alternativas que valorizassem e trouxessem mais dignidade para a atividade dos carroceiros e carrinheiros. “Poderiam ir na linha de reconhecer a atividade e dar condições técnicas, como carrinho com motor elétrico, para realizar essa coleta”, sugere.

Ele entende que a questão do direitos dos animais também é importante, o que torna mais complicada a temática dos carroceiros. “É claro que sou contra cavalos serem maltratados. Mas daí já se incluiu junto os carrinheiros, que são de tração humana. me perguntam se não é indigno um ser humana empurrar um carrinho, mas temos que perguntar o que essas pessoas acham”, apontou, destacando que nas reuniões realizadas os trabalhadores se mostraram orgulhosos e com vontade de continuar na profissão.

Relatório destacou como uma das boas práticas do estabelecimento as atividades mo Centro de Reciclagem |Foto: Claudio Fachel/Palácio Piratini)
Catadores trabalham em centros de reciclagem |Foto: Claudio Fachel/Palácio Piratini

Em audiência realizada na Câmara, Juliana Couto da Silva, recicladora da vila Santo André, criticou também o valor oferecido como indenização pela Prefeitura. “Querem tirar as carroças e os carrinhos das ruas, mas oferecem R$ 200, o que a gente consegue numa semana de catação”, ponderou. Ela também lembrou que “sem os catadores, Porto Alegre vai virar um lixão, pois somos nós quem recolhemos tanto lixo nessa cidade”.
Sgarbossa também destaca esse ponto, e questiona quem irá recolher todo o material que hoje é removido das ruas pelos catadores. “Isso vai ficar a cargo da empresa que é contratada pela Prefeitura, o que vai gerar ainda mais custos. Porque agora não tem custo nenhum isso para o poder público, o trabalho realizado por eles”, observou.
Na audiência realizada no último dia 18, representantes do Executivo argumentaram que um dos objetivos é dar direitos trabalhistas aos catadores, que agora tem uma profissão informal. Cursos de capacitação e alfabetização também estão previstos para iniciar em setembro, em parceria com o Senac, e outra opção seria entrar em associações de unidades de triagem que já existem.

Mas o Movimento denuncia que muitas associações agora “se portam diferente” e que os catadores são mera mão de obra à mercê das diretorias, que definem “as formas de partilha assim como toda a direção do trabalho. Muitos destes ‘diretores’ foram, mas não são mais catadores sendo que outros, nem chegaram a ‘sujar as mãos nos recicláveis'”, afirma Alex. Segundo texto divulgado pelo MNCR, dessa forma “a Prefeitura quer excluir a categoria e organizar meia duzia em galpões controlados pela politicagem municipal e entregar todo serviço de coleta seletiva à iniciativa privada”.

 *Com informações da Câmara de Porto Alegre

Sem comentários: