Reunião de Fortunati com comunidades atingidas pelas obras da Copa na região Cristal foi registrada pelo GT de Comunicação do Comitê Popular da Copa. Mais uma vez as inconsistências e meias-verdades da Prefeitura deixam a população confusa sobre seu destino.
Marcado por contradições, o processo de remoção das 1.800 famílias que vivem às margens da Avenida Moeb Caldas/Cruzeiro levam insegurança e expõe os moradores a um estado de angústia e à beira do desespero por não terem idéia de qual será seu destino.
A maioria das famílias vivem no local há mais de 20 anos. Fato que, pela legislação brasileira, lhes dá o direito de, no mínimo, serem indenizados pela posse e pelos bens erguidos para a moradia.
Foto: Lucimar F. Siqueira |
Muitos dos moradores levaram a vida toda para construir suas casas. Estabeleceram relações sociais, de trabalho, acesso à infraestrutura e outros elementos que permitem a inserção na cidade. A autoconstrução associada às intermitentes conquistas como a construção de posto de saúde e escolas realizada por governos anteriores permitiu que o poder público se colocasse numa situação cômoda em relação à suas obrigações quanto a garantia do direito à moradia adequada. Hoje, ao contrário, o governo brasileiro coloca à sociedade um conjunto de políticas públicas com verbas robustas para que os municípios não só atendam às necessidades de moradia da população mas preparem documentos e levantem informações para os Planos Locais de Habitação de Interesse Social.
Só para a elaboração deste plano(*) a Prefeitura de Porto Alegre recebeu verbas do PAC (**) no valor de R$ 65.900,00. Cabedizer que o conteúdo do Plano é síntese do relatório elaborado em 2003 pelo Instituto POLIS (Perfil da Habitação de Interesse Social de Porto Alegre).
Portanto, a Prefeitura de Porto Alegre conhece as necessidades habitacionais há bastante tempo. Existem levantamentos e diagnósticos sobre a questão habitacional desde, pelo menos, a década de 50:
- 1951 (Levantamentos Econômico-Social das Malocas Existentes em Porto Alegre),
- 1964 (Levantamento Sócio-Econômico nas Vilas e Agrupamentos Marginais de Porto Alegre),
- 1973 (Malocas: Diagnóstico Evolutivo das Subabitações no Município de Porto Alegre)
- 1981/89 - contagem do número de vilas, sub-habitações, população existente e número de famílias
- 1991 - Censo socioeconômico dos aglomerados sub-normais (IBGE)
- 1996/1998 - Censo de núcleos e vilas irregulares em Porto Alegre
- 2006/2007 - Censo de núcleos e vilas irregulares em Porto Alegre
Os resultados do levantamento do IBGE realizado em 2010 deverão mostrar em breve a situação atual sobre os Aglomerados Subnormais de Porto Alegre.
Ainda relacionada ao processo histórico administrativo, no início da década de 60 ocorreu a reestruturação do setor ligado à habitação de interesse social na Prefeitura de Porto Alegre configurando o DEMHAB como existe hoje. Esta reestruturação ocorreu especificamente para que o DEMHAB se convertesse no principal responsável pela gestão da política de habitação de interesse social do município.
Se observarmos o pronunciamento do Prefeito no vídeo acima e levarmos em consideração estes ínfimos exemplos históricos chegamos à conclusão de que o vídeo é uma afirmação da forma improvisada como a administração atual trata da questão da habitação em Porto Alegre. No entanto, segundo o Prefeito Fortunati a Prefeitura ainda se encontra “às cegas” !
O Pronunciamento do Prefeito ocorreu em reunião realizada na comunidade no dia 29 de junho de 2011. Esta data é emblemática pois estava há exatamente um mês antes de encerrar o prazo para entrega na Caixa Ecoômica Federal do Projeto Básico das obras da duplicação da Av. Tronco.
Mas o que levou o Prefeito e todo seu staff até a Vila para se reunir com a comunidade? O protesto realizado pelos moradores se colocando em posição contrária a realização do cadastro como forma de provocar o diálogo com a Prefeitura. Esta atitude feriu os interesses da Prefeitura e foi este o único motivo pelo qual o Prefeito se dirigiu até a comunidade. No momento em que os moradores se colocaram como agentes do processo, a prefeitura se sentiu ofendida. Muito curiosa esta atitude numa cidade que foi o berço da democracia participativa no Brasil!
Ora, se o DEMHAB existe há mais de 40 anos, se os levantamentos anteriores já apontavam dados sobre as comunidades da região em questão, se a avenida estava no plano diretor desde a década de 50, porque é que há um mês da entrega do projeto na CEF a Prefeitura de Porto Alegre ainda não tinha discutido o Plano de Reassentamento com os moradores?
Que propostas apresentou?
Bônus Moradia, Minha Casa Minha Vida e Aluguel Social. A isto se resumiu o plano de reassentamento apresentado pela Prefeitura de Porto Alegre aos moradores da Av. Tronco/Cruzeiro no dia 29 de junho.
O Bônus Moradia (Indenização Assistida) e Aluguel Social compõem o grupo de Ações Emergenciais que, como o próprio nome diz, são usados para casos de imprevistos!
INDENIZAÇÃO ASSISTIDA: Em forma de bônus, em valor único, estipulado a partir do custo reassentamento/domicílio em operações convencionais da produção habitacional, dando a opção ao reassentado involuntário de escolher sua nova casa no mercado formal. Aplicado no Programa Socioambiental por sugestão do BID.
ALUGUEL SOCIAL: Recurso assistencial mensal destinado a atender emergencialmente, famílias sem moradia. Tem sido utilizado nas situações de excedentes do cadastro (famílias que ocupam a área pós-cadastro) já efetivado, quando da consecução das ações do Programa de Reassentamento.
Ficam as perguntas:
- Se o aluguel social aplica-se para os casos em que as famílias aguardam o reassentamento, como ficará no caso da Av. Tronco onde não há um Plano de Reassentamento?
- O que acontecerá se aproximadamente 2.000 famílias procurarem imóveis para alugar na mesma faixa de preços e mesma região da cidade? Evidentemente atingirá aqueles que já estão pagando aluguel e que não tem relação com a obra da Tronco.
Segundo o Prefeito, o aluguel social será utilizado enquanto o morador estiver aguardando a casa do Programa Minha Casa Minha Vida! Isto significa que a única alternativa habitacional oferecida pela Prefeitura não é DA Prefeitura, mas do governo federal. Isto não representa um problema, pelo contrário, mas mostra que a Prefeitura de Porto Alegre se retira do cenário no momento de assumir uma alternativa e joga no governo federal a responsabilidade pelas consequências dessa ação.
Cabe lembrar, também, que o Programa MCMV conta com regras, cronogramas específicos e apresenta custos para os moradores. Não é um programa de reassentamento. Ao contrário que o senso comum diz, as pessoas não recebem as casas gratuitamente. Mesmo nos menores estratos de renda, há o pagamento de hipoteca. Para os demais, cabe o financiamento via CEF.
Antes de finalizar fica uma outra pergunta: em que espaços se deu a decisão sobre as obras que deveriam ser realizadas para a Copa? Em debate recente o atual Coordenador do Comitê do RS para a Copa 2014, Carlos Eugênio Simon, afirmou repetidamente que a duplicação da Tronco não é obra essencial para a realização da Copa. As duas únicas obras efetivamente necessárias, segundo Simon, são o Estádio Beira Rio e a ampliação do Aeroporto Internacional Salgado Filho.
Com a obra da Av. Tronco provavelmente teremos quase 2.000 famílias em aluguel social a partir de 2012. Ou seja, fora das suas casas e ainda não reassentadas. Portanto, a duplicação da Av. Tronco é uma obra estratégica para quem? As incorporadoras imobiliárias?
(*) - Plano Municipal de Habitação de Interesse Social - Etapa II - Diagnóstico do Setor Habitacional de Porto Alegre
(**) 10º Balanço. Janeiro a Abril 2010. Rio Grande do Sul.
Por Lucimar F Siqueira
Geógrafa - Assessora Técnica ONG Cidade
Por Lucimar F Siqueira
Geógrafa - Assessora Técnica ONG Cidade
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